terça-feira, 17 de julho de 2007

Inicio/Fim

Entre mares e marés

Entre luas e luares

Segue o desespero de mãos dadas

Por entre ruas calejadas

Contigo a seus pés.



Num compasso bem ritmado

A procissão assim caminha

Luz e noite e pouco mais

E a sombra dos olivais

E o cantar de uma andorinha.


E o dia, noite fica

Sem ninguém por isso dar

Entre choros e lamúrias

Entre risos e penúrias

Tudo o que começa tem que acabar.


Nuno Grande/Kevin Oliveira

Descer

Sobe a rua, meu irmão
Mas não a desças logo de seguida.
Pé ante pé, passo ritmado
Assim é o andar, da vida.

Sobe a rua, meu irmão
E lá acima chegarás...
Corre, sprinta, mas não te apresses:
Nada de especial encontrarás.

Sobe a rua, meu irmão
E o prometido acharás
Mas não te iludas, pois então:
Depois de morto o que foste, serás!

quarta-feira, 11 de julho de 2007

Obrigações

Não me é permitido chorar

em vez disso tenho que sorrir.

Quando estou mal só me dão uma solução

Por um sorriso na cara e dizer uma piada.

Mas a felicidade também me foi vedada!

Não sou digne de estar bem

Mas não posso estar mal.

Em vez de estar como estou

tenho de modar conforme os que me rodeiam.

Odeio-me mais do que se possa imaginar

Amor-próprio?? (ha ha ha)

tentem antes ódio-próprio.

De mim só me fica nojo e pena

Sou a doença deste mundo

e nas folgas, o saco de porrada.

Já não vejo luz, à muito que se desvanesceu,

sobrou-me a negra realidade.

Desejo ardentemente entrar em Hades

Desejo acaber com tudo.

Quero morrer.

segunda-feira, 9 de julho de 2007

Olho de hórus - Simbolo de protecção


Solidão


Requiem

Ao lado dos mortos que me chamam demuito perto,
na clareira do bosque,deito-me sem querer, sem saber,
e, encostando o rosto à erva,
digo em voz baixa o meu nome,
a minha morada,
levanto uma palavra, uma prece,
uma lápide,
e parto.

(José Agostinho Baptista- ANJOS CAÍDOS)

Quero, quero, quero...

Quero morrer
Quero morrer, morrer...
Quero que a luz se extinga,
Quero que a chama se apague,
Quero entrar em rigor mortis,
Quero desaparecer deste mundo
E entrar nas estatísticas dos dados mortos.
Quero morrer, desaparecer, desvanecer-me em fumo...
Morte aqui espero o teu quente abraço
Leva-me contigo que eu não olharei para traz...

Poeta

Um poeta não mente no que escreve!
A tinta é o sangue que lhe corre na alma...
E cada poema que a sua mão chora
É como um contrato vitalício com a morte!

Um poeta só sente o que escreve!
Pois, só então, se funde consigo mesmo...
E só escrevendo a dor recordada o atinge
Onde a dor sentida apenas o afagou!

Um poeta não passa de um encompreendido!
Pois nem a si msmo conseguiu entender...
Mas é graças a essa falha monumental
Que se torna o maior génio de todos os tempos!

O amor é o amor

O amor é o amor- e depois?
Vamos ficar os dois
a imaginar, a imaginar?

O meu peito contra o teu peito,
cortando o mar, cortando o ar,
Num leitohá todo o espaço para amar!

Na nossa carne estamos
sem destino, sem medo, sem pudor,
e trocamos- somos um? somos dois?
espírito e calor!
O amor é o amor- e depois?

(Alexandre O'Neill- POESIAS COMPLETAS 1951/1981)

Não consigo dormir, nunca mais

Não consigo dormir, nunca mais.Ando de um lado para o outro. canso o corpo,enquanto a língua segrega uma saliva exterminadora.

Lá fora, dentro da noite, os chacais, as hienas cercama casa. mas o pior é este chacal que me esfarrapa as vísceras,
esta hiena que me devora o sonho.

Pela janela vejo a linha crepuscular da duna.um novo corpo liberta-se do meu e caminha fora demim- vejo-o afastar-se em direcção aos nevoeiros das cidades.
Sei, nesse instante, que nenhum abraço chega paraatenuar a dor da separação.Afastados, tudo o que nos resta é começar a imitar avida um do outro.

O que dissemos perdeu o sabor e o sentido.Harrar, aden, lisboa, este silêncio... capaz de ordenare desordenar o mundo. o canto sublime das miragens.

Mas vai chegar o inverno, e a tristeza dos dias começa a zumbir à roda da cabeça.

Abri a janela.avisto uma nesga de céu limpo.Lembro-me de quando trocava um sorriso por umverso, ou por um insulto.Imitávamos assim a felicidade.

O sol fulmina a memória.
Limpa-a da crueldade do passado.A vida, aqui, reduz-se a efémeros passos, surdas gargalhadas,
ideias que se evaporam lentamente.Enfim, o mundo não é assim tão grande...

E a vida, afinal, é como as orquídeas- reproduz-se com dificuldade.Mas estou cansado.Os olhos fecham-se-me com o peso das paixões desfeitas.Imagens, imagens que se colam ao interior das pálpebras- imagens de neve e de miséria, de cidades obsessivas, de fome e de violência, de sangue, de aquedutos, de esperma, de barcos, de comboios, de gritos... talvez... talvez uma voz.

O desejo de um sol impiedoso, sobretudo enquanto dormia.

E embarquei num cargueiro, desertei um java, pensei mesmo construir uma casa.Mas não foi possível.

Ainda vejo aquelas árvores cobertas de ossos luminosos,e a duna incendiada,
o deserto onde posso continuar areconstruir o universo.

Escavo no coração um poço de sal, para dar de beberao viajante que fui.Deixo o vento arrastar consigo a infindável caravanade ilusões.

E digo: que tudo se afogue na gordura das manhãs,que tudo silencie... e uma língua de fogo atinja os livrosque não escreverei.

(Al Berto- HORTO DE INCÊNDIO)

Medo da morte?

Medo da morte?
Acordarei de outra maneira,
Talvez corpo, talvez continuidade, talvez renovado,
Mas acordarei.
Se até os átomos não dormem, por que hei-de ser eu só a dormir?

(Alberto Caeiro- POESIA)

Dor

A dor, a insuportável dor que sinto
Que me atravessa os ossos e a alma
É a força que me mantém em pé...
Deam-me analgésicos
Queimem-me os receptores nervosos
Arranquem-me o cérebro pelas narinas...
Mas acabem-me com esta dor lancinante
E como resultado matem-me!
Também agradeço se a morte for a cura e não a consequência.

terça-feira, 3 de julho de 2007

A morte que está morta

A morte é que está morta.
Ela é aquela Princesa Adormecida
no seu claro jazigo de cristal.
Aquela a quem, um dia- enfim- despertarás...

E o que esperavas ser teu suspiro final
é o teu primeiro beijo nupcial!

- Mas como é que eu te receava tanto
(no teu encantamento lhe dirás)
e como podes ser assim- tão bela?!
Nas tantas buscas, em que me perdi,
vejo que cada amor tinha um pouco de ti...

E ela, sorrindo, compassiva e calma:

- E tu, por que é que me chamavas Morte?
Eu sou, apenas tua Alma...

(Mário Quintana- extraído de CARUS ARA)